Tal vez nada me seduzca más que sentir los pies del ser amado, en un contacto glorioso, deslizándose a lo largo del dorso, acariciando el rostro, y descendiendo, con su toque de pluma y hielo a lo largo de la línea de los pulmones y de las vértebras, convergiendo junto al sexo, en una unión de marfil brusco y doloroso, cuando todo es vibración y certeza.
Es preciso, sin embargo, reservar una gran dignidad para estos momentos, y la posibilidad de un despojarse total, pues no se sabe lo que podrá ocurrir, tal vez el instante venga a mostrarse tan definitivo que nosotros nos sorprendamos transformados en estatuas de cera, fijos en esa actitud de desafío y grandeza, sin embargo sensibles a las mutaciones del tiempo y a los fenómenos de la naturaleza, distantes de la familiaridad por demás humana con los musgos, el fondo del mar y las migraciones del granito.
O entonces, me puede ocurrir la tentación de desmembrar el ser amado, poseído de aquel mismo sentimiento de infinito de los niños que despedazan un juguete frágil y complicado, por encontrarlo demasiado maravilloso y por desear participar de la esencia íntima de su funcionamiento. De hecho, eso varias veces ya me ocurrió – el medio de dominar estos impulsos sería mantener las uñas muy cortamente recortadas.
Todavía muchas veces ya sorprendí mi cuarto atravesado por roldanas, cordámenes, mesas quirúrgicas, pequeñas hachas de plata, reglas, aspersorios, y demás instrumentos de disección. Más de una vez no conseguí escapar a la curiosidad de cortar las manos al ser amado, las conservo dentro de una cesta de navidad, envueltas en paja. Y, a lo largo de la pared, se pueden encontrar trofeos – fragmentos de senos semejantes a la opalina, uñas de color lapislázuli, incluso un pubis cuidadosamente seccionado.
No les doy especial valor, todavía, y lo que más me intimida de estos objetos es su terrible latencia de fuego fatuo, que emana en noches de lluvia. Peor que todo eso, sin embargo, es la mirada fija del ave que escapa de los objetos de seducción acumulados por los cantos y la terrible permeabilidad a los fenómenos atmosféricos y conjunciones astrales de efecto amenazante, a cada nuevo contacto amoroso, especialmente aquellos que implican desnudamientos, anulaciones mutuas, instauraciones de nuevos orificios y exploraciones de las posibilidades de regiones insólitas del cuerpo humano.
Claudio Willer
(Tomado de Los trazos de Pandora,
Antología bilingüe -Inédita- de la poesía
contemporánea brasileña, anotada, compilada
y traducida por Martín Palacio Gamboa)
Antología bilingüe -Inédita- de la poesía
contemporánea brasileña, anotada, compilada
y traducida por Martín Palacio Gamboa)
RITUAIS
Talvez nada me seduza mais do que sentir os pés do ser amado, em um contato glorioso, deslizarem ao longo do dorso, acariciarem o rosto, e descerem, com seu toque de pluma e gelo ao longo da linha dos pulmões e das vértebras, convergindo junto ao sexo, em uma união de marfim brusco e dolorido, quando tudo é vibração e certeza.
É preciso, porém, reservar uma grande dignidade para estes momentos, e a possibilidade de um despojar-se total, pois não se sabe o que poderá ocorrer, talvez o instante venha a se mostrar tão definitivo que nós nos surpreendamos transformados em estátuas de cera, fixos nessa atitude de desafio e grandeza, porém sensíveis às mutações do tempo e aos fenômenos da natureza, distantes da familiaridade por demais humana com os musgos, o fundo do mar e as migrações do granito.
Ou então, pode-me ocorrer a tentação de desmembrar o ser amado, possuído daquele mesmo sentimento de infinito das crianças que estraçalham um brinquedo frágil e complicado, por acharem-no demasiado maravilhoso e desejarem participar da essência íntima do seu funcionamento. De fato, isso várias vezes já me ocorreu – o meio de dominar estes impulsos seria manter as unhas aparadas bem rentes.
Todavia muitas vezes já surpreendi meu quarto atravancado por roldanas, cordames, mesas cirúrgicas, machadinhas de prata, réguas, aspersórios, e demais instrumentos de disseção. Mais de uma vez não consegui escapar à curiosidade de cortar as mãos ao ser amado, conservo-as dentro de uma cesta de natal, envoltas na palha. E, ao longo da parede, podem-se encontrar troféus – fragmentos de seios semelhantes à opalina, unhas cor de lápis-lazúli, até mesmo um púbis cuidadosamente seccionado.
Não lhes dou especial valor, todavia, e o que mais me intimida nestes objetos é sua terrível latência de fogo-fátuo, que emana em noites de chuva. Pior que tudo isso, porém, é o olhar fixo da ave que escapa dos objetos de sedução acumulados pelos cantos e a terrível permeabilidade a fenômenos atmosféricos e conjunções astrais de efeito ameaçador, a cada novo contato amoroso, especialmente aqueles que implicam desnudamentos, anulações mútuas, instaurações de novos orifícios e explorações das possibilidades de regiões insólitas do corpo humano.
É preciso, porém, reservar uma grande dignidade para estes momentos, e a possibilidade de um despojar-se total, pois não se sabe o que poderá ocorrer, talvez o instante venha a se mostrar tão definitivo que nós nos surpreendamos transformados em estátuas de cera, fixos nessa atitude de desafio e grandeza, porém sensíveis às mutações do tempo e aos fenômenos da natureza, distantes da familiaridade por demais humana com os musgos, o fundo do mar e as migrações do granito.
Ou então, pode-me ocorrer a tentação de desmembrar o ser amado, possuído daquele mesmo sentimento de infinito das crianças que estraçalham um brinquedo frágil e complicado, por acharem-no demasiado maravilhoso e desejarem participar da essência íntima do seu funcionamento. De fato, isso várias vezes já me ocorreu – o meio de dominar estes impulsos seria manter as unhas aparadas bem rentes.
Todavia muitas vezes já surpreendi meu quarto atravancado por roldanas, cordames, mesas cirúrgicas, machadinhas de prata, réguas, aspersórios, e demais instrumentos de disseção. Mais de uma vez não consegui escapar à curiosidade de cortar as mãos ao ser amado, conservo-as dentro de uma cesta de natal, envoltas na palha. E, ao longo da parede, podem-se encontrar troféus – fragmentos de seios semelhantes à opalina, unhas cor de lápis-lazúli, até mesmo um púbis cuidadosamente seccionado.
Não lhes dou especial valor, todavia, e o que mais me intimida nestes objetos é sua terrível latência de fogo-fátuo, que emana em noites de chuva. Pior que tudo isso, porém, é o olhar fixo da ave que escapa dos objetos de sedução acumulados pelos cantos e a terrível permeabilidade a fenômenos atmosféricos e conjunções astrais de efeito ameaçador, a cada novo contato amoroso, especialmente aqueles que implicam desnudamentos, anulações mútuas, instaurações de novos orifícios e explorações das possibilidades de regiões insólitas do corpo humano.
Cláudio Willer. Poeta brasileño. Nació en Sao Paulo, en 1940. Ensayista y traductor. Algunos libros publicados: Anotações para um Apocalipse, 1964; Dias Circulares, 1976; Jardins da Provocação, 1981; Volta, 1996; Estranhas Experiências, 2004; Poemas para leer en voz alta, 2008. Taductor al portugués del Conde de Lautréamont, Antonin Artaud y Allen Ginsberg, entre otros. Como crítico y ensayista, ha colaborado en suplementos y publicaciones culturales tales como: Jornal da Tarde, Jornal do Brasil, revista Isto É, jornal Leia, Folha de São Paulo, etc. En varias ocasiones ha sido presidente de la Unión Brasilera de Escritores. Realizó estudios de Sociología, psicología y terminó un doctorado en Literatura Comparada. Co-editor de la revista electrónica Agulha.
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